O professor é um perigo para o mundo (Pt. 1)
Quando usamos a palavra "mundo", muitas vezes queremos dizer: modelo social dominante. Um professor pode ser um perigo para o modelo social que domina o mundo.
Estava ele, o professor Pascoal, a perambular pela rua com as mãos para trás e o pensamento ao longe, os olhos debaixo dos óculos fitando o nada no horizonte e o semblante esboçando um sorriso reticente. O nome dele, Pascoal, dado por seu avô, homenageava o monte que diziam nos livros de História, pelo menos os do século passado, que Cabral avistara antes de adentrar em terra brasileira com a sua quadrilha. Perdão: esquadrilha. A invasão tinha a intenção de pilhar os índios que sua trupe encontrou. Que não era novidade para eles, conforme dizem alguns livros proibidos de hoje. O Monte Pascoal até que tentou impedir o bando português de penetrar no continente, mas, a natureza tem também um líder e esse líder quis que o homem fosse mais forte e sacaneasse com ela.
Uma garota magra e branca, com cabelo negro, curto e cacheado, trajando uma bata laranja com estampa indiana que descia até a cintura e encontrava com a calça jeans índigo blue que descia o restante até os pés cobertos por um tênis da Nike bloqueava o caminho do professor. Ela também usava óculos e conservava a aparência de gente que se acha intelectual, consciente das questões de suma importância para o ser vivo. Era daquelas pessoas que gostam do retrato do Che Guevara tirado pelo Alberto Korda e popularizado pelo Andy Warhol e diz ser amante da ecologia. Havia tirado mais um bolo de papel de dentro da bolsa de pano e a tiracolo que ela levava consigo e entregava para os transeuntes quando o professor se viu de frente para ela a receber a oferta do papel. Não foi preciso o professor pegar no próprio para recusá-lo. Apresentou para a moça as duas palmas da mão, como se quisesse dizer que não carregava nada. O docente reconheceu ser a garota uma aluna dele. Estavam os dois próximos à faculdade onde ele lecionava sociologia. Nisso, começaram a dialogar.
- Qual é, professor, não gosta de santinhos?
- Do pau oco não, minha filha! E olha, você está severamente passando uma informação falsa de si. Vou denunciá-la por falsidade ideológica, estelionato ou qualquer outro artigo que enquadra quem passa uma imagem de si e mostra outra coisa com o que faz. Por que quer me enganar? O que eu te fiz? Te dei péssimas notas?
Veio-lhe, encerrando seu rosto sorridente, o pedido de esclarecimento da protagonista da conversa.
- Sobre o que está falando, professor?
- Ora, filha, quem olha para você imagina se tratar de alguém bem informado, intelectual, politizado, sabedor dos problemas do Brasil e de seus causadores, e, no entanto, você repassa um papelote sugerindo votar no candidato do PSDB à Presidência do Brasil?
A garota, só pelo respeito ao professor, que em sala de aula dá um show em termos de conscienciologia, teve uma espécie de epifania. Enxergou longe e viu o quanto ela estava sendo inocente conflitando as aspirações que mantinha com a postura política que tomava, ainda que para ganhar um dinheirinho apenas. Até que as aspirações ela não precisava se sentir culpada, pois, por ser uma garota jovem, ela era presa fácil para o terrorismo psicológico que a mídia faz para controlar a opinião de quem se expõe a ela. E já que a garota não conseguia se desprender e não se expor aos veículos de manipulação, ela não tinha o que reclamar. Isso a confundiu bastante.
O professor avistou do lado, sentados na grama em uma parte do campus universitário, alguns hippies fumando baseado. Eles usavam os santinhos para envolver a erva e enrolar em forma de canudo. Parecia que a gramatura e textura do papelote servia bem ao propósito. Voltou ao diálogo então o professor, indicando com os olhos a cena para a aluna.
- Seria uso de mensagem subliminar para informar as propostas desse candidato sem se comprometer com os moralistas que ele quer que votem nele também, minha cara? Tem um pastor que vai levar um grupo de evangélicos a votar nesse cara. Será que esse pastor nos próximos cultos vai dizer que seu rebanho deve concordar com o uso de drogas e sua legalização, coisa que faz parte do conjunto de repulsa da fé que ele representa?
Maconheiro também, o professor ofereceu a aluna um exemplo de tática usada em aliciação de mentes para o voto. É claro que o tal partido não pensara no golpe que se formava, mas ficaria super satisfeito se soubesse que foi hábil em recrutar eleitor até no material que empregou para fazer sua panfletagem. O problema é com os militantes do adversário, que não são bobos e se tiverem oportunidade levam tudo o que puderem para denegrir a imagem do outro às claras.
- Me diz, minha cara, mais uma falsidade ideológica, não é mesmo? A gente sabe que incentivar o uso de tóxicos se relaciona com estar de acordo com o crime organizado. Nem tanto contra o combate à saúde da população.
- Professor, o senhor está exagerando!
- Talvez sim, minha cara. Mas te dou um exemplo claro de como é possível manipular a opinião das pessoas com coisa pouca, informação indireta, que são verdades incutidas em mentiras ou falsa informação. É assim que esses partidos todos agem em época de eleição. A força da imaginação dos marqueteiros trabalha para eles. E é aí que esse pessoal dos veículos de mídia ganha dinheiro. Eles não têm compromisso com o que o povo vai sofrer depois de eleito o candidato que lhes pagam. Olha isso aqui!
O professor mostrou o celular para a aluna e ela assistiu nele a um vídeo espalhado pelo Whatsapp. Um suposto carteiro entregava folhetos publicitários com o rosto da Dilma, candidata do PT à Presidência. Em seguida o professor pediu que ela assistisse o próximo, no qual um policial mineiro faz severas acusações contra o candidato do PSDB.
- Bem, minha filha, concorda que fica difícil escolher um ou outro candidato e que nós somos bonecos na mão desse pessoal que quer parar na Presidência do país se apresentando como o mais honesto e na hora que eles chegam lá se vê outra coisa?
- É um círculo vicioso, professor!
- Que nós mantemos! Devíamos abominar esse tipo de coisa e todo mundo votar “99 – Confirma” para anular o voto. Cinquenta por cento de votos nulos em um pleito desses anula o pleito e obriga a aparição de concorrentes novos. Votar em branco é perigoso. Não vemos para onde vai o voto e essa urna eletrônica não é confiável, pode mandar para um dos dois partidos em disputa.
- Concordo que fica difícil, professor, mas... o do carteiro parece ser mais impressionante e foi parar na Globo o assunto.
- É difícil, mas não é por isso, minha filha. É difícil porque nos sujeitamos a assistir tevê ou a consumir qualquer outro objeto de mídia. Se não entrasse em sua vida nenhum desses vídeos você não entraria em contato com eles e tomaria sua decisão por outros meios. Talvez mais corretos.
Tendo dois materiais audiovisuais em questão, o professor quis mostrar para a aluna dele o quanto ela precipitava.
- A Globo, analisando por uma série numerosa de esforços midiáticos que ela nos mostrou, se opõe ao PT. Tanto a emissora cuidaria de passar o que denigre o partido, independente de ser verdade ou mentira, quanto não mostraria o mesmo tipo de material que denegrisse o adversário dos petistas. Isso é nazismo. Desonesto pra chuchu!
A ausência do material anti-PSDB na mídia oficial realmente chamou a atenção da moça. “Por que nunca há, nem nos debates, exposição dos podres do candidato da elite”, é o que passara pela mente dela bem ligeiramente. Um bichinho interno parecia impedir que ela aprofundasse o questionamento. Era o efeito do flúor e de outros tapadores em seu cérebro que a impedia de discorrer por mais tempo o que pensara.
- No que você acredita mais: em um vídeo onde uma pessoa se veste de carteiro e tendo juntado folhetos publicitários de um candidato faz o que manda a pessoa que o filma? Ou em um vídeo no qual um homem, de cara limpa, só ele e a câmera, se identifica, apresenta documentos que supostamente comprovam o que ele fala e argumenta coisas que todos podem constatar, pois são de conhecimento público?
- Analisando dessa forma, professor, mudo minha opinião. É realmente mais autêntico e comprometedor para quem o criou o segundo vídeo.
A moça nem esperou seu mestre de sociologia dizer qualquer coisa e foi logo jogando em um cesto de lixo o material publicitário que carregava. Para não ser desonesta ela sequer cogitou ir receber os cinquenta reais que o comitê que a contratou para fazer a entrega ia lhe pagar. “Não vou mais contribuir com a ascensão do crime organizado”, pensou ela. Mas não disse. Em seguida, apresentou um ar de estar bastante aborrecida e indignada por ser presa tão fácil para o terrorismo midiático, como disse seu professor. Tirou seu celular da bolsa para fazer uma ligação e antes de começa-la reclamou do clima com seu interlocutor.
- Não fique triste, querida! O tempo todo somos enganados. Coletivamente isso acontece diariamente. Veja o que ocorre com o clima: não chove nem a porrete e nessa época do ano as chuvas são frequentes. E ainda vêm falar sobre contaminação por um vírus maldito que saiu lá da África. Há muito o que saber-se sobre isso e não nos falam. Não sabemos outra visão que não a que a mídia nos passa: aquecimento global, crise do Ebola. Mas será que é assim mesmo e pronto? Não há nada de obscuro para ser suspeitado e discutido com a população em vez de apenas induzir ela a um comportamento? Temos só deveres? E essa coisa de recrutar drogados como curral eleitoral, recrutar evangélicos, membros de grupos sexuais, torcedores de futebol, não é fruto de engenharia social nociva? A mídia, vilã, fica impune? Tudo isso está em jogo nessas eleições. Até o seu celular pode ser um contribuinte para que o clima esteja como está. Já ouviu falar sobre o Haarp?
A moça desligou rapidamente o aparelho que mantinha à mão e fulminou o mestre com o seu olhar de curiosidade número dois. E ele não quis faltar com a informação para ela. Só disse que ela deveria aguardar para ouvi-lo na sala de aula. E se você quiser saber também o que ele tinha a dizer para seus alunos, acompanhe a segunda parte deste conto.
Grato pela leitura!
Nenhum comentário:
Postar um comentário